passivo, grátis.

o telefone tocou. a mãe já tinha ido dormir. luís maurício correu pra atender. era fernanda. queria que ele desse uma passadinha na casa dela. era tarde para luís maurício. ela insistiu. ele se esquivou, não poderia deixar a mãe sozinha. ela persistiu. ele disse que não dava pra ir. ela teimou. ele sugeriu se encontrarem no dia seguinte. ela...quis ir até a casa dele. luís maurício a chamou de desequilibrada. fernanda quis saber o que havia de errado com ela. queria carinho, amor, sexo selvagem. malhava três dias por semana, usava imenso arsenal de cremes e xampus e loções, vestia a roupa certa....tinha um monte de homem atrás dela. menos luís maurício. ele bocejou. fernanda desligou. luís maurício precisava beber algo, encher a cara. pegou uma garrafa de licor que a mãe tomava com as amigas. virava o copinho e se imaginnava um caubói tomando bourbon num saloon. no oitavo shot de amarulla, pensou em ouvir um disco da barbra streisand. ele sempre se acalmava com babs cantando. resolveu dormir. sonhou com um negro suado, musculoso, vestindo apenas uma sunga, entrando pela janela do quarto. luís maurício se encolhia embaixo das cobertas, até que criou coragem e perguntou pro negão: o que você quer? o intruso respondeu, já bem perto da cama de luís maurício: não sei, o sonho é seu? luís maurício acordou suado. levantou e sentiu um peso nas costas. a força da gravidade era anabolizada pela culpa de saber o que queria no sonho. resolveu lutar contra a densidade do ar. era a hora de levantar mesmo. tinha de preparar o café pra mãe. pegou o jornal na porta. abriu nas páginas de classificados, sessão de acompanhantes. deu-se a sinapse: vislumbrou uma saída para a angústia. olhou o número do anúncio do jornal e ligou. a atendente disse bom dia. luís maurício queria colocar um anúncio. ela pediu o texto. ele engoliu em seco. pensou, respirou com segurança e disse: passivo, grátis.